sexta-feira, 7 de maio de 2010
Efeitos de Vivências Traumáticas em Crianças
Como as vivências podem influenciar o desenvolvimento na infância e na adolescência Há necessidade crescente de estudos, pesquisas, conduta e intervenção psicológica e psiquiátrica para as crianças e adolescentes expostos a eventos traumáticos. Alguns estudos revelam que crianças e adolescentes têm alto risco de desenvolver diferentes problemas comportamentais, psicológicos e neurobiológicos como conseqüência das vivências traumáticas ou experiências de vida estressantes. Outros trabalhos referem que, em algumas pessoas, as experiências traumáticas podem não produzir efeitos psiquiátricos desastrosos e mesmo até alguns efeitos positivos.
Cada vez mais se analisam as variedades de eventos traumáticos precoces ou em tenra idade e sua verdadeira importância no desenvolvimento de quadros conhecidos, tais como o Transtorno de Estresse Pós-Traumático, os Transtornos de Ansiedade, Transtornos Depressivos, Transtornos Comportamentais e outros, ou mesmo nos sintomas de luto traumático das crianças. Apesar do empenho dos pesquisadores, ainda faltam estudos bem desenhados e cientificamente expressivos para análise dos sintomas e quadro clínico de transtornos emocionais conseqüentes ao estresse experimentado por crianças e adolescentes em tenra idade.
Há interesse cada vez maior sobre o impacto de eventos traumáticos em crianças e adolescentes, até por conta dos recentes desastres naturais (tufões, furacões, terremotos, tsunamis) e dos “cataclismos” criados pelo homem, através dos atos de violência (guerras, violência urbana e doméstica, etc).
A pergunta que se faz é se existiriam, e quais seriam, os fatores protetores individuais contra esses traumas, de tal forma que algumas pessoas parecem menos vulneráveis que outras em relação às vivencias estressantes.
O que se observa na clínica diária, é que algumas crianças e adolescentes, vítimas desses traumas, se adaptam e se recuperam de maneira surpreendente, apesar da experiência sofrível pela qual passaram. Constata-se através da revisão de pesquisas sobre o tema, existir uma grande variedade de respostas emocionais aos eventos traumáticos que acometem crianças e adolescentes e, assim, fica cada vez mais difícil atribuir responsabilidade exclusiva ás vivências emocionais precoces.
Uma ocasião - dando um exemplo irônico sobre a importância das fragilidades pessoais em relação àquilo que vida coloca diante de nós - lembro um paciente criado em orfanato que vivia com sintomas extremamente histéricos, sofrendo e fazendo sofrer quem dele se acercava afetivamente. A tudo ele atribuía o fato de ter vivido em orfanato. Aliás uma excelente instituição, que acabava por formar seus internos em excelentes profissionais técnicos.
Um dia, diante de tantas afirmativas suas de que “era assim e era assado” por ter sido criado em orfanato e como se aproximava a data da reunião trianual de sua turma de instituição, disse-lhe que levasse vários cartões de visitas meus para distribuir entre seus pares; se ele estava assim, problemático por ter vivido em orfanato, então, certamente, todos seus colegas de classe deveriam também estar passando pelos mesmos problemas e precisando de tratamento.
Discute-se a existência de uma personalidade mais imune às vivências traumáticas ou, por outro lado, se o apoio social e familiar seria o fator decisivo para essas crianças a se recuperarem, impedindo assim uma conseqüência mais patológica do trauma. Apesar das pesquisas que investigam alterações hormonais causadas pelo estresse em tenra idade e as conseqüências dessas alterações no desenvolvimento emocional futuro, o que se vê na clínica e na vida em geral, é que as conseqüências psicológicas das vivências parecem depender muito mais da personalidade sobre a qual agem essas vivências do que das próprias vivências em si.
Isso corresponderia a dizer que as reações dependem muito mais do agente “agredido” do que do agente “agressor”. Entre as variáveis potenciais que determinam as conseqüências dos traumas vividos por crianças e adolescentes em longo e médio prazo, devemos considerar fortemente as eventuais psicopatologias e predisposições preexistentes nessas pessoas.
Além das variáveis individuais de vulnerabilidades ao trauma, as conseqüências de vivências traumáticas sobre o psiquismo das crianças e adolescentes podem ter também um componente cultural e mesmo étnico. Como exemplo, referimos duas pesquisas. Uma delas, envolvendo uma mostra de 349 adolescentes de nove escolas dos EUA, verificou que 76% delas relataram terem sido testemunhas ou terem sido vítimas de pelo menos um evento violento nos últimos três meses. Dessas exposições à violência o que mais se associou foi o Transtorno de Estresse Pós-Traumático e a Depressão (Ozer, 2004).
A outra, de Seedat (2004), verificou que mais de 80% de uma mostra de 2.041 adolescentes quenianos relataou exposição à violência, como vítimas ou testemunhas, mas somente 5% dessa mostra desenvolveu sintomas completos de Transtorno de Estresse Pós-Traumático, e 8% desenvolveram sintomas de Transtorno de Estresse Pós-Traumático parcial.
Talvez a diferença entre uma criança americana e uma queniana quanto as dificuldades para a vida cotidiana imunize as mais sofridas contra os efeitos de certos eventos, ou seja, maiores dificuldades de vida poderiam fazer com que alguns eventos fossem traumáticos para uma criança americana e nem tão traumático para uma queniana. Se isso fosse verdade, então as dificuldades pragmáticas da vida, as vivências mais penosas e as frustrações, até certo ponto, contribuiriam para melhorar a adaptação futura da pessoa.
Em um estudo de109 adolescentes que sofreram abuso sexual, incluindo toques sexuais, beijos, carícias nas mamas ou nos genitais, tentativas de penetração e penetração por alguém da família ou de fora dela, 50% tiveram diagnóstico de Transtorno de Estresse Pós-Traumático, aproximadamente 33% foram assintomáticas e o restante teve outros problemas não significativos do ponto de vista sintomático (Bal, 2004). Algumas pesquisas importantes mostram que, felizmente, e ao contrário do que pode-se pensar, não é a expressiva e maciça maioria das crianças submetidas a traumas que desenvolve transtornos emocionais significativos.
Também em adultos, parece que a expressiva maioria das pessoas expostas à vivências traumáticas não desenvolve o Transtorno de Estresse Pós-Traumático. Vieira (2003) refere estudos epidemiológicos indicando que o Transtorno de Estresse Pós-Traumático afeta aproximadamente 15% a 24% das pessoas expostas a eventos traumáticos.
Isso nos leva a crer existirem outros fatores e outras variáveis influindo nas respostas emocionais aos traumas, como por exemplo, características da personalidade, como já dissemos, sensibilidade pessoal afetiva e emocional, estrutura de apoio familiar e social e, obviamente, a própria natureza do trauma.
O perfil afetivo da pessoa que reage é fundamental para a valorização da experiência vivida, a ponto dos eventos serem mais traumáticos para uns que para outros. Tem ainda o “fator depressão”, ou seja, o fato das pessoas mais depressivas terem muito mais dificuldade adaptativa diante dos estressores da vida. Na prática, a tonalidade afetiva responsável pela “valorização” do trauma seria representada pela pessoa que lamenta chorosamente as experiências vividas, dizendo sofrer “até hoje” as conseqüências “malditas” de tudo que aconteceu de terrível, e por outra pessoa que, vivendo experiências igualmente traumáticas, regozija-se por “tudo isso já ter passado” e sente-se muito bem por "ter superado essas vivências".
Juntando isso ao fato do Transtorno de Estresse Pós-Traumático ser acompanhado de taxas elevadíssimas de Depressão (comorbidade), surge a clássica pergunta; a Depressão e o Transtorno de Estresse Pós-Traumático seriam síndromes distintas ou, ao contrário, seriam aspectos diferentes de um mesmo fenômeno emocional. Se assim fosse, então o Transtorno de Estresse Pós-Traumático seria apenas um outro tipo de manifestação clínica da depressão.
Para quem se interessa pelo tema, colocando-se como termos a serem pesquisados "transtorno do estresse pós-traumático", "trauma psicológico" e "crianças e adolescentes" em dois bancos de dados relevantes da literatura científica para a medicina (MedLine, PsycInfo), encontrará no mínimo 445 artigos relevantes.
Ali vê-se que, entre uma ampla variedade de eventos traumáticos expressivos, como por exemplo a violência na comunidade, desastres naturais e aqueles criados pelo homem, abuso e maus-tratos a crianças, acidentes em estradas, exposição a doenças clínicas e lide com a morte, é muito grande o número dos casos de violência na comunidade - violência urbana - que acaba resultando em sintomas de Transtorno de Estresse Pós-Traumático (Julio Fernando Peres, Antonia Nasello).
Efeitos Orgânicos do Estresse
Para entender os efeitos orgânicos do estresse, lembramos que a base de liberação hormonal está situada no cérebro (hipófise), portanto, as questões cerebrais influem diretamente no funcionamento endócrino de todo organismo. A influência hormonal do estresse atinge mesmo as glândulas situadas fora do cérebro através de um eixo que liga o Hipotálamo (núcleos da base), a Hipófise e as Supra-renais.
A secreção da maioria dos hormônios pela hipófise obedece ao estímulo de pré-hormônios elaborados nos núcleos cerebrais paraventriculares, e estes núcleos são controlados por, pelo menos, dois tipos de estímulos: o estresse e o relógio biológico, responsável por todo ritmo do organismo (sono-vigília, ciclos hormonais das mulheres).
Assim, uma das áreas mais pesquisadas quando se trata dos efeitos físicos das emoções, é no chamado eixo hipotálamo-hipófise-suprarrenal, ou seja, um sistema que começa no cérebro, na região do hipotálamo (fortemente influenciado pelas emoções), segue pela gandula hipófise (também localizada no assoalho do hipotálamo) e suas repercussões sobre a glândula supra-renal, situadas, como o nome diz, sobre os rins e outras manifestações alérgicas com vulnerabilidade à infecções variadas.
Efeitos Psicopatológicos dos Traumas
O maior volume de pesquisas sobre o impacto psicológico dos traumas em crianças e adolescentes, entretanto, se concentra em abusos, maus tratos e violência doméstica em geral. Em graus muito variáveis de adaptação e superação, crianças que sofreram abuso e maus-tratos correm maior risco de desenvolverem os seguintes quadros, de acordo com os seguintes trabalhos:
Fonte: mais informações no site psiqweb
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