quinta-feira, 3 de junho de 2010

O pensamento abstrato na adolescência

A conquista do pensamento abstrato muda a maneira de ver o mundo. Rebeldia e desejo de transformar e projetar o futuro são as novidades
Novo raciocínio influencia o juízo moral e a obediência a regras

Para Piaget, essa conquista não está relacionada simplesmente à maturação biológica e à idade cronológica, mas também aos estímulos que o indivíduo recebe. E é aí que entra o papel da escola. "Situações-problema, desafios e oportunidades diárias para as crianças e os jovens pensarem são fundamentais. Algumas pessoas passam a vida toda sem conseguir sair do estágio concreto, anterior ao abstrato. Para elas, é muito difícil entender conteúdos científicos e até mesmo nuances dos relacionamentos sociais e emocionais", ressalta Luciene.

Por meio do pensamento abstrato, muda a forma de encarar normas sociais e regras de conduta. "A diferença básica é que, diferentemente dos tempos de criança, a regra não é mais seguida às cegas - sua validade começa a ser discutida. As implicacões passam a depender de um contexto", explica Antonio Carlos Amador Pereira, professor da Faculdade de Psicologia da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP).

A fala de Fernando*, 14 anos (leia no destaque da primeira página), dá contornos mais nítidos a essa noção. E outra situação-problema ajuda a ilustrar a diferença entre o pensamento infantil e o juvenil. Pergunte a um jovem e a uma criança o que seria justo fazer com criminosos que foram capturados. "Colocá-los na cadeia" seria a provável resposta de um pequeno. Trata-se de um pensamento tipicamente concreto, sem grande ref lexão sobre as circunstâncias do ocorrido. Por outro lado, um adolescente que já domine o pensamento abstrato poderia dizer: "Primeiro, é preciso tentar saber os motivos que levaram ao roubo. A punição pode ser diferente se os ladrões estavam uma semana sem comer ou se apenas tinham preguiça de encontrar trabalho".

Justamente por começarem a se ver capazes de analisar as coisas de maneira ampla, os adolescentes têm um senso de justiça muito forte. Num cenário em que surgem em cena a contestação e até as brigas em nome dessa convicção, o professor deve entender que não se trata de mera provocação. O jovem está saindo de uma moral tipicamente heterônoma, na qual segue as regras por medo da repreensão, e começa a operar uma moral autônoma, na qual a regra é seguida por se respeitar um valor próprio, uma moral introjetada e que gera prazer e recompensa em seguir. "O jovem já consegue situar a lei fora da autoridade. Por essa razão, ele precisa de muito mais justificativas para acatar qualquer norma. Nessa fase, não costuma aceitar nada imposto", explica Luciene.

A mudança de comportamento também traz grandes implicações para a formação da identidade. É verdade que a forma como cada um se vê e enxerga o mundo é um processo que dura desde o momento em que nascemos até a morte. Na adolescência, entretanto, ele é ainda mais agudo e latente, pois a entrada no mundo adulto está ligada à necessidade de definir valores pessoais, morais, políticos e religiosos.

Fonte: Nova Escola

Um comentário:

  1. Excelente Artigo. Aliás, lendo rapidamente o titulo dos outros artigos, assuntos muito importantes, é uma imensa colaboração para aqueles que buscam entender o humano em si sob um viés da psicologia. Grato.

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