Quantas vezes, vemos em nossos filhos a segunda chance de realizarmos nossos sonhos frustrados?
Às vezes, agimos desta forma inconscientemente, mas às vezes …
Bem, é preciso estar conscientes de que nossos filhos são pessoas com individualidade e sonhos próprios, e que nosso papel nesse processo é orientá-los para que alcancem a realização profissional e estejam satisfeitos com a decisão escolhida.
Quando começamos a pensar sobre o relacionamento de pais e filhos verificamos logo a importância da nossa conduta, como pais, em relação a eles. O que eu, como pai ou mãe, posso construir nessa personalidade, e o que posso destruir também? Onde eu incentivo, estimulo, e onde eu debilito, enfraqueço? O que eu posso determinar, alterar, etc … ?
Será que eu sou o tipo de pessoa que elogia, valoriza as coisas que esse filho consegue fazer com esforço, ou acho que ele tem sempre que fazer o melhor possível. porque essa é a obrigação dele? Eu posso ser uma pessoa que tem uma visão meio depreciadora, onde só identifico traços negativos nele.
Essa situação pode parecer meio distante, mas para você entender melhor, é só pensar no tipo de pai ou mãe que teve. O que você ouvia? O que você recebia deles? Dependendo da educação que teve, você pode desenvolver duas posições: ou você repete com seus filhos tudo aquilo que recebeu, ou restaura, isto é, muda, corrige, melhora.
Se, por exemplo, você teve um pai muito repressor, muito castrador, pode perfeitamente repetir esse tipo de comportamento com seu filho, mesmo que não tenha gostado e tenha sofrido um pouco com isso.
É o famoso conceito: “Se eu passei por aquilo, meu filho também pode passar”. Se você restaura, passa a ser mais liberal. Mais interessante, é que não importa muito o grau de cultura, nível social, etc … Nesse momento, o que surge, é a vivência e essa vivência passa por cima de muita coisa.
A pessoa que repete ou restaura, de um modo adequado ou inadequado, sente-se realizada, com a sensação de dever cumprido. O perigo surge quando você então, começa a querer se auto-realizar nos filhos e a projetar neles todas as suas aspirações e sonhos. Muitas vezes se trata de uma repetição. Aquilo que você não pôde fazer, de repente, seu filho pode.
Talvez você tenha tido vontade de ser médico e não pôde, mas vê no seu filho essa possibilidade. A pergunta chave é se na verdade, você também não foi projeto dos sonhos de seus pais. Até que ponto suas escolhas foram suas, ou você simplesmente acolheu e aceitou escolhas dele? Será que seu pai fez escolhas no seu lugar, tentando reviver aspirações dele? Talvez uma profissão, um lugar para morar, ou um marido … Dessa forma você estaria repetindo essa projeção no filho.
Lembro de um paciente que era da polícia, e que de uma maneira muito sentida e realmente magoado contou-me : “Sabe por que eu sou da polícia? Por que um dia, o vizinho bateu à porta da minha mãe para mostrar-lhe a farda, dizendo que tinha entrado para a polícia. Minha mãe, toda impressionada, disse que seu filho mais velho (eu), também entraria para a polícia. Sendo ela viúva e desamparada, não tive muita escolha, porque não podia desiludir minha mãe. Hoje sei que não é isso que quero, não é o que gosto de fazer, mas não sei nem se tenho meios de sair disso agora, ou mesmo se posso sair, estando casado, com 2 filhos … “
Era um rapaz jovem, porém triste e desiludido, frustrado e sem ânimo pela vida. Vivendo um sonho não dele, mas de sua mãe. Seguindo um caminho não dele, mas de sua mãe.
Lembro de outro rapaz também jovem, casado, com filhos, formado em engenharia por “escolha” de seu pai, mas que na verdade queria ser arquiteto. À certa altura da vida, não conseguindo mais prosseguir com sua frustração, rompe com tudo e recomeça sua vida profissional naquilo que mais queria, passando por cima de todas as dificuldades e pressões da família.
Se você passou por esse tipo de situação e se tem uma tendência a repetir nos filhos a educação que recebeu, então o cuidado nessa área deve ser dobrado, porque em algum momento, suas escolhas podem começar a ser empurradas em direção aos filhos. De uma maneira sutil, você pode introduzir essas aspirações pessoais neles. Será que você está preparado para ouvir seu filho dizer que quer ser missionário?
Outra situação que me recordo, foi quando um pai levou seu filho para visitar seu escritório de advocacia, com intenções de que o mesmo se interessasse em seguir sua profissão. Durante a visita, enquanto o pai se detinha em cada aspecto da sala, mostrando as estantes, a mobília, etc … , ao virar-se viu que o filho estava entretido com uma revista Quatro Rodas, e absorto completamente nas fotos dos carros nem se quer escutava o que ele falava. Mais tarde, este comentaria: “Estive mostrando o escritório para mim mesmo, empolgado com meus negócios e minha profissão. A cada vez que entro em minha sala, fico entusiasmado com a nova arrumação. Quando percebi que uma revista chamava mais a atenção de meu filho, só então identifiquei a realidade que sempre desejei não ver. Para dizer a verdade, fiquei frustrado!”.
Entendo a frustração desse pai, mas percebo, no entanto, como ele próprio conseguiu detectar a posição do filho e converter o caminho. Em alguns casos, essa conversão é feita, mas em outros, mesmo sabendo que o filho deseja tomar outro caminho, muitos pais não se conformam com tal decisão.
Se você trilha hoje, um caminho escolhido por seu pai ou mãe, com certeza terá mais dificuldade em “abrir mão” do seu sonho, saindo do esquema de repetição nos filhos.
Projetar nossos sonho neles, não se restringe somente à área da profissão. O desejo que tem uma mãe de ver sua filha independente financeiramente, ou solteira, revela muitas vezes o desconforto em que ela vive na vida da casada e totalmente dependente do marido. Talvez queira reviver na filha o que ela nunca conseguiu. Outro exemplo, é quando a filha interrompe o trabalho por motivo de casamento ou nascimento dos filhos, e isso é visto com revolta e frustração. Algumas vezes, essa situação é até muito bem aceita pela filha, que decide dar uma pausa no trabalho para a educação do bebê e no entanto a mãe encara como um momento de poda no trabalho e realização profissional, lembrando ela mesma do momento em que teve de abrir mão de sua carreira para estar com os filhos e nunca mais retomou. Esse choque de opiniões e desejos, tumultua a relação.
Fonte: Artigo publicado na revista Casal Feliz (Ano XII – no. 45)
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